No bairro do Rosário em Ouro Preto tem a Rua Gabriel Santos. Na minha infância a turma chamava de Rua de Cima. Tinha o casarão abandonado, que atualmente reformado é o Caesar Park Ouro Preto ( o de 3 andares parece na foto escondendo atrás da igreja). Eram aproximadamente uns 100 comodos onde a gente se divertia entre passagens secretas e outras surpresas. Nas paredes ocas do casarão havia a passagem para o armazém do sr. José Ribeiro onde a cambada entrava e se empaturrava de doce de leite com conhaque (inconsequência mesmo). Essa turminha nada fácil "andou" tirando um monte de coisas lá; até pólvora para fazer bombas rojões - baita confusão que deu; muita sova em lombo de menino difícil era o melhor remédio para esse desando.
Na foto tem a porta lateral da igreja onde a gostosona do bairro, Cristina Kaelu dava seus amassos ressucitar o fantasma da Maria Pé de Chinelo. A meninada gostava de espreitar na surdina e aprender como se faz a coisa. Tem também a casa do Vicente "cavalo sem dente", que nunca tomava banho. Tinha apelido de "Cascão", antes mesmo da personagem do Mauricio de Souza existir. Tem a casa do "Sá Onça"... (todo mundo no bairro tinha apelido), que morava perto do "Sô Lôbo". O mais engraçado é que não podiam se encontrar. Atracavam com tanta fúria que se não apartasse, um morria. E se bem observados via-se neles certa semelhança com estes bichos. "Sô Lôbo"era desengonçado mesmo. Passava todos os dias de volta da padaria com os pães debaixo do braço e outros tantos nos bolsos que comia vorazmente. Tem também na foto a casa da minha professora particular de português que insistia em me ensinar que "chapéu" se escrevia com a letra "ó" o final e não "u". Errado não era, mas se contássemos uns 100 anos atrás. Tem a descida do largo do Rosário onde os carrinhos de rolimã no paralelepípedo eram o inferno da vizinhança. A torre onde eu batia sino. Azaradamente um dia, durante a festa de Nsa Senhora, na dobrada do sino, com a corda amarrada nos punhos me fez voar para o lado de fora, arrastando-me por baixo e, na rodada, me trouxe por cima. Vi todo mundo lá em baixo. Foi a primeira vez que voei, mesmo que por alguns segundos. Catástrófico. Ainda bem que não passou disso, senão já teria ido para o inferno mais cedo.
É a rua inesquecível da minha vida. Nosso casarão, o sobrado colonial, número 14.
Hoje foi reformado. Vão tirando aos poucos a originalidade. Esse negócio de preservar é muito difícil. Acima a entrada do sobrado na atualidade; abaixo a aparência há muito anos. os irmãos do número 14 da Rua de Cima - Ricardo (Sabuquinho), (Bete, minha prima), Eduardo (Pão-com-ôvo), Eu (Pancho-Villa), não sei porque e Marília (Roy-Rogers), porque era muito brava e o tal era um cawboy americano da época. Olha só a olhada de satisfação da mana para o fotógrafo.
E eu nessa foto - só tinha joelho - cada um virado para um lado? Vergonha sobrava e faltava fotogenia numa tortuosidade imensa. Meus dois irmãos que nem sabiam como cruzar os braços. Só a Bete estava toda-toda. Filha do Tio Geraldo, menina criada nos moldes de paris (em BH) que estudava piano e balé.
Eh saudade boa!
sábado, 6 de março de 2010
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Sensacional... Cada frase lida, coração disparado! Lindo texto, linda foto, maravilhosa sensação... e como não poderia faltar, ótimas risadas. Ah! Que ninguém se atreva à mexer com Tia Conceição, minha tia/mãe linda, doce e sensata, sempre...
ResponderExcluirAdorei: "...não sei porque e Marília (Roy-Rogers)... E eu nessa foto - só tinha joelho - cada um virado para um lado?... Meus dois irmãos que nem sabiam como cruzar os braços...."
Bom demais viu rs
Um beijo do tamanho do céu em todos vcs...